O paradigma do morcego: Porque Batman é o melhor personagem de todos os tempos

Por Tarcísio Gomes

A inspiração para escrever este texto surgiu depois da leitura de um tópico no blog dos Quadrinheiros, intitulado “Por que o Batman é o melhor personagem de todos os tempos?”. Como o próprio título do texto afirma, a ideia de que Batman é o melhor personagem de todos os tempos, ainda que não seja uma unanimidade, é um paradigma. Isso fica claro quando um defensor dessa ideia – como eu próprio – é questionado sobre o porquê de Batman ser o melhor. A resposta provavelmente virá repleta de exemplos, explicações e referências às inúmeras abordagens do personagem tanto nos quadrinhos quanto em outras mídias. Serão citados em pelo menos 90% dos casos, a visão do homem-morcego por Frank Miller em meados da década de 1980, alguns clássicos roteiros escritos por Neal Adams, a visão sombria da década de 30, ainda nas mãos de Bob Kane, os filmes de Tim Burton, a Série Animada do início dos anos 90, e recentemente a trilogia The Dark Knight dirigida por Christopher Nolan.

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O que faz desses casos tão especiais em relação a toda a história de Batman ao longo de quase 80 anos, desde sua primeira aparição nos quadrinhos da Detective Comics número 27, em 1939? Quando o Batman surgiu, no início da década de 1930 (lembrando que existe a teoria de que Batman teria sido criado em 1932, e publicado apenas em 39), os Estados Unidos passavam por uma tentativa de recuperação econômica após a “quebra da bolsa” e a crise econômica de 1929.

O cenário em que Batman surgiu abria espaço para um herói que fosse parte do povo; mesmo que Bruce Wayne seja podre de rico, ele tem uma característica que o assemelha à maioria de seus leitores/fãs: no fundo, ele era apenas uma criança desesperada tentando fazer alguma coisa sobre seu drama pessoal (representando o drama da distopia social) que ele vivera. Essa proximidade com a realidade em que ele surgiu é um fator importante na construção da ideia de que Batman é o melhor personagem de todos os tempos.

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Durante os chamados trinta anos gloriosos dos Estados Unidos (1945-1975), Batman tomou aqueles contornos “coloridos” e “infantilizados” que todos conhecemos apresentados muito claramente na série de TV do Adam West, no desenho dos Superamigos e até mesmo nos quadrinhos (que chegaram a mostrar coisas bizarras, como um Batman com trajes de sete cores diferentes, uma para cada dia da semana, e o inesquecível Bat-Cão).

Toda essa aura colorida em torno do herói iria desaparecer nos anos finais da década de 1970, dando lugar a uma versão mais Dark do personagem, que iria se desenvolver até chagar – na minha opinião, e de muitos outros fãs – ao seu ápice nas mãos de Frank Miller, com “O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight Returns nos EUA)” e “Batman – Ano Um (Batman – Year One)” em 1986 e 1987 respectivamente. É interessante notar

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que, na época em que surgiu esse esforço para levar Batman de volta as origens sombrias os Estados Unidos estavam passando pela sua primeira grande recessão econômica do pós-guerra, um quadro levemente semelhante àquele em que Batman surgiu na década de 1930. É por isso que eu acredito que os fãs do homem-morcego tem tanta preferência por esse período: proximidade que, nesses casos mais do que em outros, o personagem apresenta com a realidade dos fãs. Mas nem só de sociologia vive a admiração dos fãs por Batman.

Batman está presente como um dos símbolos/ícones da cultura pop ocidental (principalmente entre os jovens, mas não se restringindo a eles), há pelo menos 60 anos, e uma coisa se manteve constante todos esses anos: a enorme admiração dos fãs. Com certeza essa admiração foi o mais importante de todos os fatores que contribuíram para a formação da ideia de que o Batman é o melhor personagem de todos os tempos. Mas, quais seriam os outros? Vou tentar listar e explicar rapidamente os que considero mais importantes.

Verossimilhança: como já disse duas vezes, a proximidade que o Batman apresenta com o “mundo real” em que os fãs vivem tem grande importância na forma como o personagem é visto por todos aqueles que o acompanham/acompanharam, de que forma ou por quanto tempo for ao longo de sua existência.

Humanidade: não é só o fato de Batman ser “um de nós” entre tantos super-heróis de outro planeta ou de natureza sobre-humana que o torna tão humanizado. As próprias características da personalidade do Batman – e de Bruce Wayne – como a constante luta contra si mesmo para não cruzar a tênue linha que separa o herói do justiceiro vingativo, a devoção a um ideal, com todas as suas forças, da forma que só nós (humanos) somos capazes de fazer, as limitações e os inúmeros e incansáveis esforços para superar seus próprios limites.

As relações: a forma como Batman/Bruce Wayne se relaciona com os outros personagens de suas histórias – Richard Grayson, Jason Todd, Selina Kayle, Harvey Dent, Ra’s Al Ghul, e principalmente Alfred e James Gordon. São relações de confiança, de dúvida, de amor, de ódio, de lealdade, da mesma forma que qualquer pessoa estabelece suas relações de sociabilidade.

Os outros personagens: Estamos falando de Batman, mas nem ele, nem nenhum outro personagem são construídos sós. Estão rodeados de outros personagens. E poucos estão rodeados de personagens secundários tão protagonistas (perdoem o trocadilho) de suas próprias histórias. Para citar alguns exemplos, os Robins Dick Grayson e Jason Todd, com seus próprios dramas e tragédias pessoais, buscando sua própria cura; James Gordon, que como dito na postagem do “Picareta Psíquico”, é o mais humano de todos os personagens, e que teve sua história pessoal brilhantemente trabalhada por Frank Miller em Ano Um, e Alfred, a figura paterna de Bruce Wayne; seu fiel mordomo sempre fez muito mais do que servir-lhe o café e costurar suas feridas.

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O Batman pode ser qualquer um: O tema – muito presente no último filme da trilogia de Christopher Nolan – é para mim, outro grande responsável pelo fenômeno que é o morcego. Toda criança (quase toda… ou só eu era louco assim?) sonha em poder ser um de seus heróis. E nenhuma criança está tão próxima de seu herói quanto aquela que sonha ser o Batman. Claro, a ausência do trauma da morte parental, dos recursos, do treinamento, dos recursos, da inteligência, dos recursos, da vontade, da devoção e dos recursos impossibilita essa vontade de se concretizar. Piadas a parte, o Batman de fato, pode ser qualquer um; a proximidade do alter-ego de Bruce Wayne com os alter-egos de muitos de nós é grande. Não que as pessoas sejam em segredo vingadores encapuzados, mas todos temos vontade de lutar por aquilo em que acreditamos, de defender aquilo que achamos ser correto, e Batman tem feito isso por nós.

Segredos: Todos temos segredos. Todos os super-heróis tem segredos, nem que seja só a identidade secreta. Mas Bruce Wayne esconde tantos segredos quanto todos aqueles que ao longo desses 73 anos leram, assistiram, imaginaram, escreveram e acompanharam sua história. E o fato de um personagem, um herói, se permitir ter segredos tão íntimos quanto os de quem o idolatra faz com que esse herói seja mais do que um herói para essas pessoas, mais do que um ícone, mais do que uma vontade. Faz de Batman mais do que um personagem: uma Lenda.

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3 respostas para O paradigma do morcego: Porque Batman é o melhor personagem de todos os tempos

  1. Biel Barata disse:

    texto perfeito! parabéns

  2. o carinha que mora logo ali disse:

    razoavel

  3. Pingback: O Batman da Era de Ouro explicado em diagramas | Quadrinheiros

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